Capatazia no valor Aduaneiro - Influência nos impostos

Entenda como a inserção do serviço de capatazia no valor aduaneiro foi capaz de aumentar o Imposto de Importação.

Postado em 02/06/2020


Capatazia no valor Aduaneiro - Influência nos impostos

Logo nos primeiros meses do ano de 2.020, os intervenientes no Comércio Exterior que atuam no setor de importação não tiveram boas notícias. Como se não bastasse a crise do coronavírus, uma decisão do Superior Tribunal de Justiça- STJ- causou ainda mais impacto no setor. 

Tal decisão foi a inclusão do serviço de “capatazia” no valor aduaneiro das operações de importação, o que causa uma elevação do valor do Imposto de Importação. 

Para entendermos a decisão do STJ, os argumentos e os impactos econômicos desta, precisamos analisar o que é serviço de capatazia, valor aduaneiro e como eles interferem no valor do Imposto de Importação.  

A PRIMEIRA JORNADA: O QUE É CAPATAZIA E VALOR ADUANEIRO?

O primeiro passo da nossa investigação é desvendar o conceito de “Capatazia”... Afinal, o que é capatazia? Quando é realizado? 

O serviço de Capatazia se refere à atividade de movimentação de cargas nas instalações dentro do porto ou aeroporto, compreendendo o recebimento, conferência, transporte interno, abertura de volumes para a conferência aduaneira, manipulação, arrumação e entrega, bem como o carregamento e descarga de embarcações, quando efetuados por aparelho portuário ou aeroportuário.  

Em suma, é um trabalho portuário ou aeroportuário de movimentação de cargas

Apenas para a curiosidade do(a) leitor(a), a capatazia também pode ser chamada de Terminal Handing Charge, geralmente se usando a sigla THC. 

Ademais, o valor aduaneiro é um conjunto de custos relativos ao frete, valor da mercadoria, e o valor do seguro. Assim, o importador deverá somar todos esses custos na sua operação de importação, o resultado dessa soma representará a composição do valor aduaneiro

E onde se encontra o valor do serviço de capatazia? O valor de capatazia será encontrado no frete, tendo em vista que o transporte de mercadoria abrange também a movimentação de cargas

E qual é a relação entre capatazia, valor aduaneiro e imposto de importação?

Para respondermos essa questão, basta entender que o valor aduaneiro será a base de cálculo para o imposto de importação... Explico melhor, como vimos, o valor aduaneiro é a soma do valor da mercadoria + seguro  + valor do frete (o qual o serviço de movimentação de cargas está imbutido). Quando este cálculo é realizado, temos o valor aduaneiro da mercadoria, e, a partir deste valor, o imposto de importação é calculado. 

Para exemplificar, vamos calcular imposto de importação: digamos que eu vá importar uma mercadoria e gaste R$ 65 mil do valor da mercadoria + R$ 15 mil de seguro + R$ 20 mil de frete, o qual incluímos o serviço de trabalho portuário ou aeroportuário de capatazia… o valor aduaneiro da minha operação de importação será de R$ 100 mil. Agora, o imposto de importação que incide no meu produto é de 10% sobre o valor aduaneiro da minha operação de importação, ou seja, a Receita Federal importação vai analisar quanto foi o valor aduaneiro da operação e cobrar 10% do valor total, no nosso exemplo, pegarei R$ 10.000,00 de Imposto de Importação.  

LEGAL… MAS COMO A DECISÃO DO STJ AFETOU OS INTERVENIENTES DO COMÉRCIO EXTERIOR? 

Primeiro, deve-se ter ciência de que o serviço de capatazia para movimentação de cargas deverá ser contratado em dois lugares: no exterior, para embarcar a mercadoria, e no Brasil para desembarcar a mercadoria. 

Quanto ao serviço de movimentação de carga no embarque da mercadoria no exterior, nunca houve muita divergência, todos aceitam que essa modalidade deva estar incluída no valor aduaneiro, base de cálculo do imposto de importação

Por outro lado, o serviço de movimentação de carga no desembarque é aquele prestado em território nacional, ou seja, quando a mercadoria já chegou no Brasil (trataremos do serviço de capatazia nessas condições)

Porém, o choque de entendimento que levou a questão para o STJ era se o serviço de capatazia, contratado para movimentação de cargas quando essa já estivesse chegado no Brasil, entrava no cálculo do valor aduaneiro. Tal discussão ocorre por conta da falta de clareza da lei que nos leva a entender que o serviço de capatazia prestado no Brasil não entraria no cálculo do valor aduaneiro. 

Essa questão já foi ao STJ várias vezes e, sempre que chegava lá, o tribunal entendia que o valor pago pelo serviço de capatazia realizados em território brasileiro não poderia compor o valor aduaneiro.  

No entanto, em nova decisão sobre o tema, o STJ mudou o seu entendimento e concluiu que o valor do serviço de capatazia, prestado quando a mercadoria já está em território brasileiro, deve ser incluída na composição do valor aduaneiro

A consequência lógica? A inclusão dos valores do serviço de capatazia contratado para movimentação de cargas em território nacional, no no frete que compõe o valor aduaneiro, causou um aumento na composição deste último e, por conseguinte, o aumento dos valores pagos no recolhimento do Imposto de Importação. Para se compreender os impactos práticos de tais aumentos, segundo a Confederação Nacional da Indústria (CNI), as importações terão aumento médio de 1,5% em seus custos.

Além disso, o aumento da composição do valor aduaneiro afeta também outros impostos aduaneiros, dentre eles o Imposto sobre Produto Industrializado- IPI, visto que sua base de cálculo é valor aduaneiro + valor do imposto de importação.

Agora que já sabemos os conceitos e as consequências que envolvem a questão, vamos estudar quais eram os argumentos do STJ antes da mudança e depois da mudança e o motivo que levou o tribunal ao novo entendimento.    

OS ARGUMENTOS DO STJ PARA A NOVA COMPOSIÇÃO DO VALOR ADUANEIRO

A questão foi levada ao STJ por conta de uma norma instituída pela Receita Federal do Brasil que deixava muito claro que o valor do serviço de capatazia prestado no país da importação deveria fazer parte do frete que faz a composição do valor aduaneiro

Assim, tivemos duas posições do STJ, demonstradas a seguir:

Movimentação de cargas: quais eram os argumentos do STJ antes da mudança? 

Anteriormente, o STJ concluiu que o Regulamento Aduaneiro e o Acordo de Valor Aduaneiro estabeleceram que apenas os serviços de Capatazia contratados até a chegada da carga ao porto ou aeroporto nacional poderiam fazer parte do frete na composição do valor aduaneiro, ou seja, segundo esse argumento, a capatazia cobrada para movimentação de cargas já em território brasileiro não poderia integrar o frete no valor aduaneiro, pois a importação já teria sido feita. 

Por sua vez, o Ministro Sérgio Kukina já demonstrava sua afinidade com o argumento de que o serviço de capatazia poderia sim fazer parte do frete na composição do valor aduaneiro. Segundo ele, o transporte internacional de mercadoria abrange o descarregamento dessa no local de destino e, por este motivo, o referido trabalho portuário ou aeroportuário deveria fazer parte do valor de frete na composição do valor aduaneiro, base de cálculo do imposto de importação

Por fim, nessa oportunidade, o STJ entendeu que a norma da Receita Federal contrariava a lei, o que não poderia por conta da hierarquia, uma vez que a lei é maior, excluindo-se do frete que compõe o valor aduaneiro, todas as despesas com capatazia para movimentação de cargas em território nacional.  

Nova posição: o trbalho portuário e aeroportuário como parte da composição do valor aduaneiro

Ocorre que, em março de 2020, o STJ, em julgamento muito importante, mudou o seu entendimento, como demonstrado abaixo…

Apresentando argumentos defendidos pelo Ministro Sérgio Kukina, o Ministro Francisco Falcão apresentou voto discordando de uma parte da corte ao entender que o Acordo de Valoração Aduaneiro, acordo internacional seguido pelo Brasil, permite que os Estados criem, livremente, as leis que permitem ou não que o valor do serviço de capatazia seja aplicado na cadeia de composição do valor aduaneiro

O Ministro entendeu que as leis aduaneiras, quando tratam do serviço de capatazia de movimentação de cargas, dizem respeito a todo e qualquer ato praticado em zona alfandegada, sendo o único espaço em que tais movimentações são permitidas. Ou seja, já que a mercadoria chega ao Brasil e vai para zona alfandegada, o referido trabalho portuário ou aeroportuário é praticado na mesma, o que permite que este integre a cadeia da composição do valor aduaneiro

Além disso, quando a lei diz que o valor aduaneiro conterá todas as despesas realizadas até o porto/aeroporto ou local de importação, deve-se incluir as que se realizarem no porto/ aeroporto ou local da importação, ou seja, o serviço de movimentação de carga previsto no frete deve compor o valor aduaneiro mesmo quando é realizado no território brasileiro.

A questão foi tão acirrada que, até o último voto, o julgamento estava empatado em 4 a 4… O voto desempate foi dado pelo Ministro Napoleão Nunes, que seguiu o voto do Ministro Falcão, Sérgio Kukino e outros, e fixou o entendimento de que o serviço de capatazia deve ser inserido na cadeia de composição do valor aduaneiro

Por fim, os ministros contrários a essa tese, além de apresentarem suas teses, entenderam que o STJ deveria continuar com o seu histórico de decisão, contudo, foram vencidos.  

A consequência de decisão foi o aumento do imposto de importação, além do aumento do Imposto sobre produto industrializado. 

DA MUDANÇA À CONCLUSÃO

No presente post estudamos um tema com novos contornos e muito importante para as operações de importação… Este tema está relacionados com os impostos aduaneiros, principalmente, o imposto de importação que sofre consequências diretas da inclusão dos valores relativos ao trabalho portuário ou aeroportuário de capatazia na composição do valor aduaneiro, o que gera mais gastos ao importador.

Além disso, estudamos os argumentos utilizados pelo STJ para incluir o trabalho portuário ou aeroportuário de capatazia, prestado em território brasileiro, no valor aduaneiro. Neste sentido, primeiro demonstramos qual era a antiga posição do STJ em relação ao tema e quais eram os argumentos utilizados. Depois, demonstramos os novos argumentos do STJ para justificar a inclusão do serviço na composição do valor aduaneiro. 

Discordando da nova posição adotada pelo STJ... a decisão será alvo de críticas feitas pela FBB Advogados, nas quais serão publicadas no próximo post sobre o tema. 

Por enquanto, resta-nos observar que a nova posição do STJ se esforça para buscar argumentos favoráveis ao poder de tributar do Estado, em contrapartida, o contribuinte só paga mais impostos e suas operações no comércio exterior ficam ainda mais caras… Devemos lembrar, que este aumento em cadeia será repassado aos consumidores brasileiros das mercadorias. Em última análise, a nova decisão apresenta uma afronta à cidadania tributária, uma vez que busca onerar o contribuinte ainda mais. 


Para se manter atualizado, é só ficar ligado aqui no blog. E se quiser tirar dúvidas sobre qualquer assunto de Comércio Exterior, agende uma consulta com nosso especialista.


Deixe seu comentário
Categorias:

Tags: capatazia,impostos,aduaneiro,valor aduaneiro


Nenhum comentário. Seja o primeiro a comentar!
0 comentários